Eu estava sozinha, presa em um quarto de hotel sem grandes
opções de entretenimento. Um cenário solitário e até um pouco depressivo.
O relógio do celular indicava que já havia passado da meia
noite e mesmo assim eu ainda não havia conseguido dormir. Parece que até por
brincadeira os fantasmas da minha vida, do meu passado escolheram este dia para
me assombrar.
Quando fecho os olhos vejo a imagem da minha melhor amiga,
uma anoréxica morta. Por ter diminuído a luz, sombras se projetavam na parede
atrás de mim e era iguaizinhas ao Carter, meu padrasto maníaco. O barulho da
chuva indo ao encontro do asfalto me lembrava duma suave melodia cantada por
meu pai, ele cantava esta musica quando estava com raiva e perdia o controle.
Totalmente doentio.
E o pior de tudo? Eu não tinha sono algum, mas não poderia
ficar acordada. O que me assustava mais? Minha amiga morta, que
coincidentemente morrera por minha culpa. Meu pai também morto em um acidente
de carro... chovia forte no dia, exatamente como hoje. Ou o meu padrasto
tarado, satânico que, infelizmente continua vivo?
Se o seu palpite é “o monstro que os três se transformam
para me apavorar”. Você está corretíssimo!
Escolhi ficar acordada, ereta, encarando o celular e mexendo
nele aleatoriamente. Não sei até que horas continuei assim, mas me recordo de
uma luz fraca invadir o quarto por meio das brechas da janela.
... Garota é
encontrada morta em casa, sozinha.
... Ninguém precisa
ficar sabendo, querida.
... O papai morreu,
Morgana, ele não está mais aqui. Nunca voltará, jamais.
§
Fui acordada com fortes batidas na porta e uma voz grave
dizendo:
— Acorda Morgana! ACORDA! — reconheci imediatamente o dono
da voz. Bob, dono do motel, gordo e barbudo. Não tem esposa, filhos ou uma família.
Seus gases fedem muito e faz o melhor sanduíche de pasta de amendoim do mundo.
Levantei meio mal humorada, afinal estou morrendo de sono e
gritei um ‘ok’ para o Bob me deixar em paz.
Tomei banho e fiz tudo o que tinha que fazer, depois desci
para a recepção do motel. Mais um dia entediante da minha vida, mais um dia
desperdiçando a minha existência.
Como minha vida se transformou nisso? Eu poderia contar, mas
é doloroso demais para mim. Deixe-me fumar um pouco que tudo fluirá
naturalmente.
Quando papai morreu eu
tinha dez anos e observei a cada dia que passava a mamãe enlouquecer, beber e
se drogar. Um mês depois ela trouxe um estranho para casa e eu fiquei com medo
dele. Eles se casaram pouco tempo depois. Carter, seu nome real, era, na
verdade, um homem preguiçoso e vagabundo. Ele nos explorava, mas ela não ligava para isso. Só estava
concentrada em fazê-lo feliz, nas ardentes noites de sexo e nos orgasmos. E
como eu fiquei? Fui abandonada! Tive que me ‘criar’ sozinha e ainda por cima
aguentar os gemidos e a barulheira a noite inteira.
Sim... e isso foi só o começo.
Eu sempre notei um
comportamento estranho do Carter comigo. Em qualquer oportunidade ele fazia
questão de me tocar, mostrar seu membro para mim e era nojento...
completamente. Mas eu não era a única que notava.
Claro que não, ela sabia. Sabia de tudo, mas fingia ser
cega.
Estava distraída
pegando uma flor em uma árvore quando ele chegou atrás de mim e sussurrou
"não grita", meu coração
gelou, eu havia notado sua presença antes, mas não pensei em nada. Ele segurou
minha mão e começou a andar devagar me puxando para o jardim onde tinha uns
arbustos. Quando o susto maior passou e voltei a pensar novamente fiquei
imaginando como sairia da situação, decidi que iria lutar, virei e dei uma cotovelada
nele, ele me segurou e deu um soco no meu rosto. Eu chorava e ele me arrastava
mais rápido até chegarmos aos arbustos, ele segurou minha cabeça no chão e me
deixou de quatro, enquanto me estuprava falava coisas nojentas e às vezes me
batia. Depois que 'terminou' mandou eu não me mexer e sussurrou no meu ouvido “Ninguém
precisa ficar sabendo, querida”.
Fiquei deitada na
terra chorando por um tempo que parecia uma eternidade, esperando que tudo
aquilo não tivesse sido real, esperando que não passasse de um pesadelo. Eu
tinha treze anos, e nesse dia perdi minha virgindade e minha inocência.
Eu nunca contei a ninguém sobre isso. Desde então os homens
passaram a me assustar diariamente, mantive uma longa distancia de Carter.
Procurava me ocupar e passar menos tempo em casa vivia indo para casa das
gêmeas por conta do medo. Ele nunca mais me estuprou, não completamente. Continuava
me pedindo para fazer um boquete nele, ou me chamava para darmos uns amassos no
quarto dele. Até que eu fiz 16 anos e não aguentei mais a situação, liguei para
policia e fiz um escândalo com a minha mãe, porém ele me fez desistir de dar a
queixa. Mamãe não acreditou em mim, por isso eu fui embora. E agora estou
morando neste quarto de motel, assustada demais para seguir em frente,
envergonhada demais para voltar atrás.
Eu nunca fiz sexo com garoto algum. Apenas o toque é capaz
de me lembrar do abuso que sofri anos atrás. Não tenho medo do Bob, de alguma
forma consegui confiar nele, e além do mais ele é gay. Ele me protege das
ameaças e me proíbe de usar maconha.
Fantasma número dois.
Pandora e Perrie, as gêmeas, e eu sempre fomos melhores amigas. Conforme fomos
crescendo cada uma mudou seu comportamento. Eu estava estranha, não falava mais
com ninguém, não saia para as festas. Pandora era estudiosa e por isso passava
mais tempo trancada em seu quarto, mas Perrie era obcecada, obcecada por tudo,
o corpo, garotos, festas, sexo e principalmente o corpo. Todo dia ela vinha com
uma dieta maluca encontrada na internet ou parava de comer completamente; seu
problema foi se agravando e agravando. Um dia ela havia armado, chamou uns
garotos da escola e inventou uma festa na piscina só para garotas... Quando
realmente queria fazer uma orgia na piscina. Quando vi aqueles garotos querendo
me tocar e fazer coisas comigo entrei em pânico e briguei com ela. Ficamos sem
nos falar. Seus pais viajaram pro fim de semana, as duas ficaram em casa
sozinhas, mas Pandora foi estudar na casa de uma amiga. Perrie ficou sozinha e
não estava bem. Me mandou mil mensagens chorando e pedindo desculpas, ainda com
raiva ignorei. Na segunda feira recebi a mensagem, Perrie estava morta. Ela
passou o fim de semana inteiro vomitando e comendo o que causou o rompimento do
esôfago, ela morreu e eu poderia ter a salvado. Parei de frequentar a escola no
meio do semestre e parei de falar com a Pandora. É difícil ser amiga de alguém
quando ela tem o mesmo rosto de uma pessoa morta.
Enfim, depois de passar por tudo isso, desesperada eu
recorri ao primeiro anuncio de trabalho que vi; recepcionista de um motel. Bob
não ligou por eu ser menor de idade, ele também estava desesperado. Quando
contei minha situação ele me acolheu. Lembro também que ao terminar de falar
ele me disse:
— Você já é a segunda
aqui que me aparece com essa historia.
Estou aqui faz dois meses e até hoje não sei de quem ele
estava falando.
isso é antigo para caralho, tõ falando lá para 2015 quando eu achava que essa historia seria revolucionária e hoje vejo que ela é só um clichêzão, mas tamo aí :)
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