Esperei.
Talvez 10, 20 minutos tenham se passado. Não sei. Não posso dizer com certeza.
Continuei esperando, olhando para os lados, esperando. Não só o ponto de
ônibus, como a rua, estava deserto. Continuei esperando. Tentando ignorar a dor
costumeira em meu estômago. Como se chamava isso? Acho que é fome. Sim, fome.
Não posso afirmar com certeza, mas eu acho que é isso. Não sei, estou confuso e
com sono.
Sentei-me
na ponta, mas todos os bancos estavam vazios.
“Ele
vai chegar”
Talvez
seja a única coisa que tenha certeza, não só hoje, mas na vida. Ele sempre
vinha. Esperei mais um pouco e, nesse meio tempo, carros começaram a circular
pela rodovia antes deserta. Não estava mais sozinho, mas ainda assim, estava.
Eles faziam barulho.
O
ponto de ônibus começou a se encher, alguns idosos e alguns estudantes vestidos
com seus uniformes. Ninguém se aproximou de mim, eu era um estranho e fedia.
Mais
algum tempo se passou, eu não sei quanto, mas sei que passou, pois o ponto
encheu-se e esvaziou-se e, mesmo assim, ninguém olhou para mim. Talvez eu
devesse tirar um cochilo, afinal, eu acordei cedo para chegar até aqui. Quando
ele chegasse, iria me acordar. Tenho certeza.
Dormi.
Talvez 20, 30 minutos tenham se passado. Não havia mais estudantes no ponto.
“Será
que ele não vem?”
Não.
Ele sempre vinha. Irei esperar mais um pouco.
Esperei.
Observei, nesse meio tempo, o céu mudar e o calor se intensificar. Meu estômago
ainda doía.
Resolvi
desistir. Hoje ele não viria.
Demorei
um pouco para chegar em casa. Era longe do ponto onde eu ia toda manhã, era uma
longa caminhada. Eu sempre fico com medo de deixar Zitao sozinho, mesmo que ele
tenha 12 anos. Era o meu único parente, sem ele eu estaria totalmente solitário
e abandonado. Não gosto de ficar sozinho.
Mas
minha maior decepção é que eu não traria nada para Zitao hoje já que ele não
veio. Por que ele não veio? Gostaria de saber responder.
Dei
cinco batidas na porta e esperei. Eu disse a Zitao para nunca abrir a porta
para estranhos, mas sempre que ele ouvisse cinco batidas seguidas, ele poderia
abrir. Seria eu.
Zitao
apareceu à porta, com um sorriso e me perguntou algo que partiu meu coração.
—
O que trouxe hoje? Estou com fome, hyung.
Seus
olhos eram confusos quando ele notou minhas mãos vazias. Eu não trouxe nada.
—
Ele não veio hoje, Tao. Sinto muito, mas o hyung dará um jeito. Não te deixarei
com fome. — falei com incerteza. Eu não tinha ideia do que faria para nos
alimentar.
Zitao
não tinha escola hoje, então ele comeria em casa. A merenda do colégio era um
alivio para mim, mesmo que não fosse o suficiente para um guloso garoto de 12
anos. Mas Tao conhece nossas limitações.
—
Está tudo bem, hyung! Nem estou com tanta fome assim... — eu sei que ele só
falou isso para me confortar, mas esses momentos só reforçavam o quanto que eu
me sentia inútil. Eu era seu responsável e deveria poder, pelo menos, colocar
comida na mesa. Mas eu fui demitido três meses atrás. Trabalhava em um mercado
de rua e, por algum motivo não dito, eles me botaram para fora.
Eu
era o melhor funcionário.
Ainda
estava do lado de fora, por isso, pus a mão no ombro de Tao para que nós
entrássemos. Fechei a porta.
—
Deixe disso, eu darei meu jeito, sim?
Tao
fez que sim com a cabeça, a fome falava mais alto do que nós dois.
Após
isso, ele enfiou-se dentro do quarto. Provavelmente assistiria televisão.
Zitao
era meu primo por parte de p- por parte do homem que me pôs no mundo. Seus pais
morreram em um acidente e ele veio morar comigo e minha família quando eu tinha
nove e ele três anos. Nossas famílias vieram da China há muito tempo.
Minha
família nunca fora do tipo amorosa e unida. Eles nunca gostaram de mim e nunca
me desejaram, eu fui um completo erro para eles e a chegada de Tao em nossa
casa só piorou tudo. Até que quando eu tinha catorze anos, eles me descartaram
de vez junto com Tao. Eu não fui à escola desde então, mas sempre lutei para
Zitao fosse, e ele dava resultados, era muito inteligente. Tenho orgulho.
Sem
o meu segundo grau completo, não posso trabalhar de verdade. Vivo em trabalhos
informais que não geram muito dinheiro e sempre falta. Não tomo muitos banhos
para evitar gastar água. Moramos em uma casa cedida por um vizinho, acho que
ele teve pena de nós, mas eu agradeço muito a ele. Só temos uma televisão; uma
geladeira e fogão velhos; um sofá duro; e mais algumas outras coisas básicas em
nossa pequena casa; que não passa de três cômodos. Temos um quarto – que eu
divido com Zitao, uma sala/cozinha e um banheiro. E eu agradeço muito, por um
tempo nem isso nós tínhamos.
Desde
que fui despedido, venho lutando a qualquer custo para conseguir dar o que
comer a Zitao, nem me preocupo comigo. Eu sei que posso esperar, mas ele ainda
é uma criança. Meu desespero às vezes me leva a cometer alguns furtos, nada
graves, os quais eu não me orgulho. Ou eu vou me humilhar e saio na rua pedindo
algum dinheiro. Não é como se me dessem, eu conseguia muito pouco, mas eu
continuava me virando.
Em
uma dessas manhãs de humilhação, eu o conheci. Vestindo seu uniforme de ensino
médio e um rosto emburrado. Me aproximei e lhe pedi dinheiro. Ele não pareceu
se compadecer com minha história no começo, mas então ele falou:
—
Qual o seu nome? — sua voz era embolada.
—
Luhan. — respondi tímido. Eles nunca falavam comigo.
—
Sehun. — se apresentou e estendeu sua mão, a toquei incerto e o observei pegar
algo em sua mochila. Primeiro, ele tirou uma sacola e depois algumas cédulas de
sua carteira. Me entregou tudo depois. — Luhan, apareça aqui amanhã, ok? Esse é
o meu ônibus. — apontou para o ônibus que se aproximou. — Eu tenho que ir
agora.
Então
Sehun entrou no ônibus, antes mesmo de eu raciocinar ou de lhe dizer obrigado.
Fui para casa feliz e guardei o lanche para quando Zitao chegasse. Comi um
pouco para saciar minha fome e guardei o dinheiro para depois. Eu não era
burro.
Sehun
e eu nos encontramos toda manhã quando ele vai para o colégio nesse mesmo
ponto. Ele traz comida, roupas, dinheiro e até me ajuda com empregos. Ele é
rico e eu não entendo o porquê de ele estar toda manhã nesse ponto de ônibus
público.
Mas
Sehun é um mistério. Diferente dos mocinhos ricos que assisto nos dramas. Ele
tem um ótimo coração e eu sou muito grato a ele, apesar de não ter certeza
sobre qual o motivo dele me ajudar tanto. Eu nunca perguntei, mas essa era só
mais uma de tantas coisas as quais eu sou ignorante.
De
qualquer forma, Sehun não viera hoje e, apesar de que eu nunca saberei o
motivo, continuo me perguntando porquê. Ele nunca falta, nunca mesmo. Não
consigo deixar de esconder minha decepção. Não só por toda a ajuda, mas também
pela falta que ele faz. Sehun é meu único amigo. Tirando Tao, eu estou sozinho.
Seria
um longo sábado e eu teria que me virar, senão seria mais um dia em que
faltaria comida em nossa mesa. Mais um dia em que eu e Tao seriamos miseráveis.
Hoje
ele não viera, mas eu tinha esperanças sobre o dia de amanhã.
Escrito em 2016, acredito que a inspiração só tenha me consumido e saiu isso ai.
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