a colina sagrada

Esse costumava ser o meu momento favorito do dia, quando o sol já está se pondo, mas o céu ainda não está escuro, tampouco está tão claro. As mais diversas cores pintam o céu da tarde, passeando por variações de azul até o tom mais delicado de laranja.  Desta colina, eu vejo partes da cidade, montanhas que pouco a pouco foram povoadas e preenchidas por casinhas acima de casinhas. Os postes de luz já estão acessos. Daqui de cima, eles são só pequenos pontinhos luminosos. O vento é frio e cortante, mas, ao sentir meus ossos tremerem, me sinto viva. 

Há algo de nostálgico nesta atmosfera. É linda, mas não passou de um instante, na verdade, deve ter durado só alguns segundos. Tudo me pareceu uma eternidade, me vi congelada no momento, neste estado imutável de paz. A realidade que me espera lá embaixo é diferente, mais cruel e menos mágica. De repente, me dou conta de que quero chorar. 

Eu respiro fundo e conto até 5. 

Não funciona. Sinto o aperto na minha garganta, a emoção crescendo dentro de mim, prestes a transbordar. Mas eu me nego a chorar em público, pressiono os meus dentes contra os meus lábios, esperando que a dor me distraia dessa droga de emoção. Novamente, não funciona, meus olhos já estão molhados e as lágrimas se preparam para cair. Mordo com mais força e me obrigo a andar.  Um passo e depois outro e depois outro até que estou me afastando da igreja, colina à baixo. 

Tudo está embaçado. Não consigo enxergar nada. Não me lembro dos olhares que recebi na rua, não me lembro de chegar em casa, não me lembro de subir as escadas até o meu quarto. Mas estou aqui. Encarando a minha cama bagunçada. Meu peito pesa como chumbo e eu sinto dor e gosto de sangue. Ainda estou mordendo os meus lábios. Meus olhos ardem. Os fechos com força e água salgada rola sobre minhas bochechas. Eu respiro fundo mais uma vez, passando a mão pelos meus cabelos. Meu peito finalmente afunda. E as lágrimas caem, caem e caem. É impossível fazê-las parar. Meu queixo treme e meus soluços perdem a timidez, ecoam por todo o espaço. Mas não há ninguém para ouvir além de mim. 

Eu já não tinha controle. Deixei acontecer. Chorei por horas. 

Não consegui fazer outra coisa.

| uma carta de amor ao bonfim, minha casa, minha história. um lugar que nunca esquecerei mesmo que só tenha deixado a colina para morar ladeira a baixo. 

O plot twist, meu pai

Meu 2021 começou com uma surpresa que nunca esperei que fosse acontecer. Imaginei, é claro. Inúmeras vezes eu criei esse momento na minha cabeça. Mas nunca pensei que ele fosse tomar essa iniciativa. Arthur me procurou ontem e me pediu desculpas. E, apesar da conversa que tivemos ter sido libertadora para mim, eu ainda me sinto estranha. 

O fato é: eu não gosto mais dele. Há muito tempo essa paixão virou raiva, depois mágoa e então indiferença. Eu não sentia mais nada por ele, porém eu ainda estava magoada. Com a sensação inquieta de que não tivemos um desfecho decente, com palavras ainda entaladas na minha garganta. Não importava o quanto eu escrevesse sobre isso, eu precisava dizer na cara dele. Eu me sentia duplamente magoada por, além dele ter me tratado como um pedaço de lixo, aparentemente ele nem tinha se dado conta do que fez. E isso doía mais do que tudo.

Quando eu vi a mensagem, isso me afetou bastante, fiquei nervosa, em choque, o coração batendo que nem um louco. Consegui controlar a ansiedade e despejei tudo o queria ter dito naquela noite. Ele me ouviu, não tentou se justificar e no fim, nos despedimos para sempre. No momento, eu me senti mais leve, afinal, ele reconheceu o erro... Depois de oito meses? Isso ficou na minha cabeça e eu não consegui não stalkear. Descobri que ele não estava feliz no relacionamento dele e que acabou terminando poucos dias antes de vir falar comigo. Descobrir isso me deixou... feliz? De um jeito sádico, pensei “Olha só, você me magoou e me trocou por esse relacionamento que falhou e no final te deixou infeliz. Bem feito. Karma is a bitch.” 

E agora, sei lá. Nunca esperei que esse pedido de desculpas fosse vir, mas estou feliz que ele veio. Acho que finalmente estou no processo de cura definitivo, finalmente posso ouvir “Bixinho” sem me lembrar dele. Porque eu sou maior do que isso. Maior do que ele. Por ter sido a minha primeira experiência amorosa com alguém, eu errei demais, mas também aprendi bastante. Naquela época, eu agi conforme sabia agir. Eu tentei. Mas ele fez a escolha dele e, se a consciência pesou agora, só posso desejar que ele amadureça e lide com as suas escolhas bem longe de mim.

Obrigada por essa aventura, Arthur. 

E até nunca mais.

*

Feliz ano novo para vocês que leem essas maluquices que eu escrevo aqui <3