Sendo uma pessoa que cresceu com a cabeça totalmente afetada pelo racismo em todos os âmbitos possíveis, na maior parte da minha vida, eu consumi apenas músicas estado-unidenses. Muito por influência da minha irmã que possuía vários CDs piratas com músicas de Beyoncé, Shakira e Rihanna, eu cresci cercada por músicas da língua inglesa. Em partes isso foi bom para mim, pois me permitiu entrar em contato com a língua numa idade muito nova e aprender o idioma por conta própria. Em contrapartida, foi ruim, pois me fez crescer ignorando a minha própria cultura e identidade.
Até 2012, eu só consumia o falecido gênero Teen Pop, com Selena Gomez e One Direction sendo os meus artistas favoritos. Em 2013, eu tive minha fase emo e gótica e escutei muito rock naquele ano e foi ai que meu interesse por músicas nacionais começou a crescer. Passei a escutar Legião Urbana, Los Hermanos e etc.. Em 2014 eu já tinha dropado essa identidade gótica e estava na minha fase conceitual, ouvindo artistas considerados “indie”, que de indie mesmo não tinham nada por serem extremamente mainstream. No final daquele ano, já tinha começado a ouvir k-pop e foi o meu gênero preferido até 2017, quando eu comecei a perder o interesse.
Apesar de 2016 ter sido um dos anos mais importantes da minha vida em questão da construção de minha identidade, ali eu só estava começando a me enxergar. 2018 foi o ano que tudo realmente se firmou. Fiz amizades com pessoas maravilhosas que me apresentaram muita coisa nova e que redefiniram a pessoa que sou hoje. Por isso, apresento para vocês os meus artistas baianos favoritos.
BaianaSystem
Meu pai sempre me falou deles, mas eu achava que eles eram algum grupo de MPB antigo (as rodinhas de violão tocando legião urbana me traumatizaram profundamente), então nunca liguei para eles. Eu não me achava uma pessoa de carnaval porque eu tinha uma visão muito limitada de mim mesma. Quando eu era criança, ia toda fantasiada pro Pelourinho com os meus pais. O último carnaval que eu tinha curtido de fato tinha sido em 2012. Então por muito tempo eu acreditei nessa idiotice de que carnaval = ruim, música nacional = bosta, funk = lixo. Basicamente eu era uma pirralha arrogante (mas que gostava das músicas do 1D lol). Só fui conhecer o som de Baiana verdadeiramente em 2018 e simplesmente me apaixonei. Baiana é um fenômeno nacional e ir atrás deles no carnaval é uma loucura de gente, corpos suados e muita energia, a experiência é surreal. Baiana tem uma musicalidade que mostra o que há de melhor no Brasil e na Bahia. Nós temos uma cultura muito rica e especialmente distinta.
Primeira música que ouvi: Playsom
Música favorita: Miçanga (ouvir essa música é como passear na orla de salvador. nestes tempos de quarentena, é algo que me traz conforto).
"Colorir a estrela da manhã com o sol com o sal de Piatã com as cores do mar de Itapuã."
Novos baianos
Para ser sincera mesmo, eu nunca tinha ouvido falar em Novos Baianos até 2018 quando uma garota que eu seguia no instagram postou uma música deles no stories, mas nem ai eu dei atenção. Achei que fosse só mais um grupo de MPB voz e violão. O meu ““ex”” é muito fã deles, então quando o spotify tocou Mistério do Planeta pela primeira vez para mim, eu me permiti escutar. Agora eu sinto ódio de mim por não ter dado uma chance antes. Eles são geniais e me trazem uma paz tão grande, apesar de que eu vou associá-los sempre a imagem do meu ex. Moraes Moreira, a voz principal do grupo, faleceu esse ano e eu me sinto muito honrada te ter conhecido o grupo enquanto ele ainda estava aqui conosco, mas seu legado viverá para sempre nas músicas incríveis desse grupo revolucionário.
Primeira música que ouvi: Mistério do Planeta
Música favorita: Preta Pretinha (Só escutem essa maravilha, só assim para entender).
"Abra a porta e a janela e vem ver o sol nascer."
Os Tincoãs
No natal de 2017 meu pai me deu um livro com a biografia desse grupo que vinha com 3 CDs. Ele comprou num show que eles fizeram no TCA e tenho até autografo com uma dedicatória que sempre me conforta quando brigo com o meu pai; “Luísa, o seu pai antes mesmo de pensar nele, ele te ama” ou algo assim, não to com o livro agora e não tenho como checar. O mais impressionante é que as vozes desses caras são incríveis e as músicas trabalham com umas harmonias que me deixam toda arrepiada. Além de que eles carregam uma história de resistência da cultura negra e de umbanda. Há anos atrás, eu nunca estaria escutando esse tipo de música, mas a Luísa de hoje entende a importância da memória e da preservação da arte negra e ela ama tudo isso.
Primeira música que escutei: Deixa a gira girar
Música preferida: Meu canto de dor (eu cantei essa numa apresentação sobre racismo no colégio onde estudei e foi mt emocionante, essa música é linda para caralho).
"Ah, se Deus cobrasse o nosso ar, o que seria, o que seria do viver?"
Luedji Luna
Outra cantora que conheci graças às mesmas amigas que me apresentaram baiana. É um som que me acalma, traz paz e conforto. Fora que eu me inspiro muito no cantar dela e na pessoa que ela é. Tive oportunidade de vê-la ao vivo e, sinceramente, que mulher, viu? Só apreciem essa voz, essa arte. Apreciem a arte negra.
Primeira música que ouvi: Banho de folhas
Música favorita: Asas (essa música é quase como aquele abraço de carinho, tão leve, mas com tanto amor e significado).
"Para que te quero, asas? Se eu tenho ventania dentro."
Dorival Caymmi
Quem nunca ouviu uma música de Dorival Caymmi, né? Para mim, ele fazia parte daquele grupo de artistas cujas músicas você ouviu, mas nunca por vontade e iniciativa própria. Até que em uma aula de canto lá em 2016, eu conheci uma música dele que me marcou muito, “Nem eu”. Dorival tem uma voz e músicas maravilhosas. Quando as escuto, eu viajo para essa Bahia que ele construiu e reimagino a história. É sensacional e com certeza tem que ser uma arte que sobreviva à crueldade do tempo.
Primeira música que escutei: Provavelmente "Minha jangada" ou "O que é que a baiana tem?"
Música favorita: Nem eu (essa música é linda e mudou totalmente a minha visão do amor).
"O amor acontece na vida, estavas desprevinida e por acaso eu também."
O intuito dessa postagem é só para mostrar o quanto que eu cresci e amadureci. Minha vida toda eu quis ser outra pessoa, meu apelido na família era “americana” e eu me achava melhor do que os outros por causa disso. Graças a deus, hoje eu tenho a oportunidade de enxergar as belezas que compõem a história do meu estado e do meu país. Terra essa que também deu origem a mim, outra doida tentando se aventurar nessa vida de artista. Se quiserem escutar, ficarei feliz em recomendar essas pessoas maravilhosas para vocês.
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